Ebony transforma prêmio de “Revelação” no WME Awards em manifesto contra o apagamento de mulheres negras na indústria

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Redação MDR

Ao receber o troféu na cerimônia de 2025, a rapper questionou o timing do mercado fonográfico e expôs as dificuldades enfrentadas por artistas independentes que já constroem legado há anos, mas são tratadas como novidade.

A noite de celebração da música feminina brasileira no WME Awards 2025, realizada nesta semana, foi marcada por um momento de tensão necessária e honestidade brutal protagonizado pela rapper Ebony. Vencedora da categoria “Revelação do Ano”, a artista subiu ao palco não apenas para agradecer, mas para questionar a própria natureza da premiação e a lógica de uma indústria que ela classificou como “traiçoeira” para mulheres negras. O discurso, longe do protocolo padrão de gratidão e sorrisos, ecoou como um desabafo de quem batalha há quase uma década para ser ouvida, expondo o descompasso entre o corre real das ruas e o reconhecimento tardio do mainstream.

Para quem acompanha a cena do Hip Hop nacional, o estranhamento de Ebony com o rótulo de “revelação” é plenamente justificável. A artista carioca possui uma discografia consolidada e uma base de fãs fiel construída ao longo de anos de trabalho independente, lançamentos consistentes e uma estética visual que influenciou diversos outros nomes do gênero. Ao receber o troféu, Ebony pontuou a ironia de ser celebrada como “novidade” em 2025, quando sua carreira já acumula uma quilometragem significativa de palcos e estúdios. Para ela, o prêmio soou menos como uma descoberta e mais como um atestado da lentidão das grandes estruturas em validar o talento preto feminino antes que ele se torne impossível de ignorar.

Em sua fala, a rapper destacou que a indústria musical brasileira costuma ser implacável com mulheres negras, exigindo delas uma excelência contínua e uma resiliência sobre-humana para alcançar patamares de visibilidade que artistas brancos ou masculinos atingem com muito menos esforço. O termo “revelação”, nesse contexto, carrega um peso amargo: ele apaga o passado de luta e sugere que a artista só passou a existir a partir do momento em que o mercado decidiu lucrar com sua imagem. Ebony fez questão de lembrar que seu sucesso não aconteceu da noite para o dia e que a invisibilidade imposta durante anos custou caro para sua saúde mental e financeira.

O posicionamento da artista no WME Awards levanta um debate urgente sobre a curadoria e os critérios das grandes premiações. Frequentemente, o Rap e o Trap são tratados como nichos exóticos, e suas protagonistas só ganham os holofotes quando furam a bolha do pop. Ao recusar o papel de “iniciante grata”, Ebony reivindica o respeito pela sua trajetória e chama a atenção para outras artistas pretas que estão, neste momento, produzindo material de alta qualidade nas periferias do Brasil sem qualquer suporte ou reconhecimento das grandes marcas e gravadoras.

A repercussão do discurso foi imediata nas redes sociais e nos bastidores do evento, dividindo opiniões entre aqueles que acharam a fala dura demais para um momento festivo e a grande maioria que enxergou na atitude da rapper a postura combativa que o Hip Hop exige. Ebony não rejeitou o prêmio, mas rejeitou a narrativa confortável que ele tentava vender. Ao final, sua vitória no WME Awards 2025 será lembrada não pelo troféu em si, mas pela coragem de dizer, em rede nacional e diante da elite da música, que o reconhecimento não pode vir acompanhado do apagamento da história de quem sangrou para chegar até ali.

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